UMA INSTITUIÇÃO CHAMADA BILLY TAYLOR
Música e outras coisas

UMA INSTITUIÇÃO CHAMADA BILLY TAYLOR




Ao contrário da maioria dos músicos de jazz, William Taylor nasceu em uma família de classe média, em Greenville, Carolina do Norte, no dia 24 de julho de 1921. O pai era dentista e a mãe professora e ambos tinham um enorme apreço pelas artes. Quando o pequeno Billy tinha apenas cinco anos, a família se mudou para Washington, sobretudo por causa da agitada vida cultural da cidade.

Na capital americana, o garoto logo demonstrou uma grande aptidão musical, tendo estudado bateria, guitarra e saxofone, até se fixar no piano. Encantado com as grandes orquestras de swing que ouvia na adolescência, especialmente a de Duke Ellington, o jazz logo se tornou a sua forma de expressão musical favorita. O rádio e os concertos de jazz pontuaram boa parte da juventude de Taylor, que graduou-se em música pela Virginia State College, em 1942.

Naquele conturbado início dos anos 40, em plena II Guerra Mundial, o bebop fervilhava e apontava o futuro do jazz. A música de Charlie Parker e Dizzy Gillespie também fisgou os ouvidos e o coração do jovem pianista, que teve a oportunidade de conhecer pessoalmente esses ídolos durante uma apresentação da orquestra de Earl Hines, no teatro da Howard University.

Em 1944, um resoluto Billy Taylor aporta em Nova Iorque, disposto a vencer na Meca do Jazz. Freqüentava com avidez os clubes da Rua 52 e participava de gigs com os músicos novaiorquinos. O titã Ben Webster, que havia participado de uma jam session no Minton’s ao lado jovem pianista, não teve dúvidas e o convidou para integrar o seu quarteto, que incluía o baterista Big Sid Catlett e o baixista Charlie Drayton.

Interessante é que quando Taylor começou a ter aulas de saxofone, Webster era o seu maior ídolo e principal influência, ao lado de Don Byas. O quarteto dividia as noites do clube Three Deuces com ninguém menos que o legendário Art Tatum, que logo se encantaria com o talento de Taylor e o tomaria como seu protegido.

Não foram poucas as vezes em que, devido a algum impedimento, Taylor substituía Bud Powell na orquestra de Dizzy Gillespie. Desse modo, a sua reputação crescia e ele era convidado para acompanhar músicos como Machito, Eddie South, Coleman Hawkins, Wilbur de Paris, Ethel Waters, Mary Lou Williams, Roy Eldridge, Jo Jones, Artie Shaw e Don Byas. Taylor integrou a orquestra de Don Redman, a primeira a excursionar na Europa, após o término da II Guerra Mundial.

No final dos anos 40, partiu para a carreira solo, formando então os seus próprios trios, por onde passaram baixistas como Charles Mingus, Oscar Pettiford, Earl May, Oscar Pettiford, George Duvivier, Bob Cranshaw, Doug Watkins, Henry Grimes e Al Hall e bateristas como Jimmy Crawford, Jo Jones, Grady Tate, Dave Bailey, Billy Cobham, Denzil Best, Ed Thigpen e Louis Hayes

Após substituir Erroll Garner no trio de Slam Stewart, no final dos anos 40, assumiu o encargo de pianista oficial do Birdland, o que lhe permitiu tocar, com regularidade, com músicos do quilate de Charlie Parker, Miles Davis, Kenny Clarke, Lester Young, Stan Getz, Milt Jackson, Art Blakey e Dizzy Gillespie, que habitualmente se apresentavam ali.

Também continuou a atuar como músico de apoio, acompanhando Coleman Hawkins, Lee Konitz, Mundell Lowe, Kai Winding, Oscar Pettiford, Ray Charles, Quincy Jones, Sonny Stitt, Roland Kirk, Lucky Thompson, entre outros. Embora tenha feito suas primeiras gravações como líder, para a Savoy, ainda nos anos 40, é a partir da década seguinte que seu trabalho ganha maior repercussão. Lançou álbuns para selos como Atlantic, Concord, Capitol, Prestige, Mercury, Riverside, Impulse e outros mais.

Uma ótima amostra da desenvoltura de Taylor no formato de trio está presente no álbum “Billy Taylor Trio With Ed Thigpen & Earl May”. Gravado entre os dias 25 e 28 de outubro e 16 e 17 de dezembro, no ano de 1957, para o selo Lone Hill Jazz. Standards como “There Will Never Be Another You”, que abre o disco, “The More I Seee You” e “I Get A Kick Of You” são executadas com enorme bom gosto e uma técnica extremamente refinada.

O blues “Sounds In The Night”, composta pelo líder, revela o seu notável conhecimento acerca das formas de expressão da música negra norte-americana tradicional e o solo de May é simplesmente hipnótico. Aliás, em homenagem ao baixista, Taylor compôs o tema “Earl May”, um bebop arejado, cuja abertura – um soberbo diálogo entre o contrabaixo e o piano – é um dos momentos mais deliciosos do disco.

O trio atinge a perfeição sonora em sua delicada interpretação de “Round Midnight”, talvez a mais confessional das composições de Thelonious Monk, realçando a atmosfera bluesy do tema. “There’s A Small Hotel”, clássico da dupla Richard Rodgers e Lorenz Hart, ganha uma versão mais lenta, em clima de balada, com uma extraordinária atuação de Thigpen.

Fabulosa versão de “Will You Still Be Mine”, com o pianista em estado de graça, exibindo o seu total domínio do idioma bop, com uma agilidade e uma profusão de idéias impressionantes. O hábil Thigpen, que depois destas sessões haveria de se integrar ao trio de Oscar Peterson e ali permanecer por alguns bons anos, é um acompanhante discreto, mas sempre muito eficiente.

A esfuziante “Titoro”, com seu clima latin jazz, é outro tema de Taylor, merecendo especial atenção a forma como Thigpen faz a sua bateria soar como um par de congas, enquanto ecos de soul jazz podem ser ouvidos ao longo dos sete minutos da faixa. A balada “Can You Tell By Looking At Me” é a quarta e última composição de Taylor e certamente a mais emocionante, com a sua sóbria mistura de elegância e romantismo.

Outro grande momento é a deliciosa interpretação que o trio dá a “You Make Me Feel So Young”, imortalizada na voz de Sinatra. Taylor parece se divertir à exaustão e May dá uma aula magna de contrabaixo jazzístico. Bebop de nobre feitura, com direito a um solo de piano antológico. O mesmo clima ensolarado perpassa a obscura “I Never Get Enough Of You”, com destaque absoluto para as belíssimas harmonias engendradas pelo líder. Um belo álbum, pouco conhecido mas de inestimável valor na discografia de Taylor e que mereceu, à época do lançamento, nada menos que quatro estrelas da Down Beat.

Mas as aventuras de Taylor pelo reino da música ainda estavam só começando. O pianista foi convidado para ser o diretor musical do primeiro programa televisivo dedicado à história do jazz, chamado “The Subject Is Jazz”, produzido pela rede NBC. Foram produzidos 13 programas, apresentados pelo crítico Gilbert Seldes, e a banda incluía nomes como Eddie Safranski, Tony Scott, Ed Thigpen, Jimmy Cleveland, Mundell Lowe, Earl May e Osie Johnson. Alguns dos convidados foram Willie “The Lion” Smith, Duke Ellington, Bill Evans, Lee Konitz, Cannonball Adderley e o compositor Aaron Copeland.

Além de pianista, o versátil Taylor também é compositor, arranjador, educador musical, bandleader, escritor, produtor, radialista, repórter televisivo e ator. Começou a apresentar programas sobre jazz no rádio ainda nos anos 60, primeiramente na WLIB e em seguida na WNEW, ambas de Nova Iorque. Também produziu uma premiada série de programas, chamada “Jazz Alive”, para a National Public radio, entre 1977 e 1982.

Na televisão, além de participar como diretor musical do “The Subject Is Jazz”, Taylor foi o primeiro negro a dirigir uma orquestra, a do programa “The David Frost Show”, em 1975, da qual faziam parte Frank Wess e Bob Cranshaw. Nos anos 80 foi correspondente do programa Sunday Morning, para a CBS, onde entrevistou dezenas de jazzistas, de várias gerações. Também apresentou, no canal Bravo, o programa "Jazz Counterpoint," que contou com a participação de convidados como George Shearing, Marian McPartland e Ramsey Lewis.

O título de embaixador do jazz dificilmente encontrará em outro músico uma tradução mais adequada. Além dos inúmeros concertos e da participação em incontáveis festivais ao redor do mundo, Taylor foi um dos primeiros músicos importantes de jazz a gravar um álbum inteiro na União Soviética (“White Nights In Jazz”, de 1998). Aliás, o pianista também criou o seu próprio selo, o Taylor Made, para produzir os seus álbuns.

Mestre e doutor em educação musical, pela University Of Massachussets, além de ter recebido o título de Doutor Honorário em diversas universidades norte-americanas, Taylor é um acadêmico respeitado e bastante produtivo. Sua tese de doutorado, “The History and Development of Jazz Piano: A New Perspective for Educators”, é considerada uma das mais originais e importantes sobre o piano jazzístico.

Além disso, Taylor escreveu mais de dez livros sobre o jazz e publicou centenas de artigos em revistas especializadas. Lecionou em instituições de prestígio, como a East Carolina University, a Manhattan School of Music, a Howard University, a University of California e a Yale University – que também lhe concederia o prêmio Ellington Fellowship – e foi artista residente na Virginia Polytechnic Institute and State University.

Como se não bastassem tantas atividades, Taylor, desde o início dos anos 90, é um dos diretores artísticos do Kennedy Center For The Performing Arts, memorial criado em 1971 em homenagem ao ex-presidente americano, com sede em Washington. Além de participar da programação de concertos e workshops, Taylor também produz um programa de rádio transmitido pela NPR, chamado “Billy Taylor's Jazz at the Kennedy Center”.

Prêmios e honrarias foram muitos. Ele mereceu os títulos de Lifetime Achievement Award, dado pela revista Down Beat em 1984, de Jazz Master, em 1988, dado pela NEA (juntamente com Art Blakey e Lionel Hampton) e de Jazz Living Legend Award, pela American Society of Composers, Authors and Publishers (2001). Em sua estante repousam um Emmy, pela produção de um programa televisivo sobre a vida e a obra de Quincy Jones, em 1983, e um Grammy, em 2004. Está imortalizado no Hall of Fame da International Association for Jazz Education.

Afastado da estafante rotina de concertos e gravações, Taylor, às vésperas dos 90 anos, desfruta de uma confortável semi-aposentadoria. Mesmo após ter sofrido um derrame que comprometeu os movimentos da mão direita, em 2002, ele não quer saber de parar completamente. É que para fazer jus ao título de incansável, o pianista ainda ministra oficinas e palestras sobre jazz, além de aparecer com freqüência em programas de rádio e televisão. O assunto? É jazz, claro!

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