Novamente no Mississipi, integrou-se à orquestra de Ernie Fields e com ela excursionou pelo país, até chegar a Los Angeles, em 1944. Adotou a Cidade dos Anjos como lar e, em pouquíssimo tempo, iria se consagrar como um dos mais inovadores e habilidosos saxofonistas do West Coast e do bebop, chegando a influenciar ninguém menos que Jimmy Heath e John Coltrane, que costumavam passar horas estudando seus solos.
Antes disso, todavia, o garoto de apenas 20 anos gostava de assistir, embevecido, às apresentações das grandes orquestras de R&B, especialmente a Roy Milton And His Solid Senders e a Louis Jordan And His Timpany. Roy Milton, aliás, foi o seu primeiro empregador na Costa Oeste e sobre o afável patrão, disse Edwards: “Roy era um sujeito muito jovial. Com ele, a vida era um grande dia feliz. Eu me diverti muito naquela orquestra”. Mas tocar R&B, por mais divertido que fosse, não satisfazia as aspirações artísticas de Edwards, que em 1945 foi convidado para substituir ninguém menos que Coleman Hawkins na banda de Howard McGhee.
Nascido em Tulsa, Oklahoma, no dia 06 de março de 1918 e criado em Detroit, Mcghee era um músico experiente, que já havia tocado com Lionel Hampton, Slim Gaillard, Andy Kirk, Count Basie, George Auld, Charlie Barnet e Thelonious Monk. Integrou, juntamente com Dizzy Gillespie e Fats Navarro, a primeira geração de trompetistas do bebop e era conhecido por causa do vigor e da velocidade que imprimia a seu sopro, sem jamais perder o elevado sentido melódico. Suas gravações para a Blue Note, ao lado de Navarro, no final dos anos 40, são consideradas das mais relevantes para a história do bebop e o grande Clifford Brown foi um de seus confessos herdeiros musicais.
A parceria entre McGhee e Edwards perdurou por cerca de dois anos e incluiu concertos e gravações com grandes nomes do jazz, como Sonny Criss, Hampton Hawes, Roy Porter e Charlie Parker, com quem Edwards costumava a disputar longas partidas de xadrez. Nessa época, Edwards começa a ganhar notoriedade graças às célebres batalhas travadas com os excepcionais Dexter Gordon e Wardell Gray nos clubes da área de Los Angeles.
Outro fato curioso envolvendo Parker e Edwards: em 1946, Bird deveria se apresentar em um concerto do Jazz At The Philharmonic. Auditório lotado, público impaciente e nem sinal de Parker. Algumas pessoas já começavam a pedir seu dinheiro de volta quando Edwards, que também integrava a trupe, disse ao produtor Norman Granz que sabia onde Bird estava. Foi buscá-lo às pressas e o concerto transcorreu normalmente. O agradecido Granz jamais esqueceu o favor e em 1998, mais de 50 anos depois, mandou a Edwards uma carta de agradecimento. Dentro, um cheque de 10 mil dólares.
Em 1947, foi McGhee quem se engajou na caravana Jazz At The Philarmonic e partiu para outras paragens geográficas e musicais. O ex-parceiro permaneceu em Los Angeles, tocando com músicos locais, como Vince Guaraldi, Leroy Vinnegar, Ray Brown e Joe Castro. Também tocou com Max Roach e Clifford Brown, Gerald Wilson, Benny Carter, Dizzy Gillespie, Benny Goodman, Milt Jackson, Earl Hines e Jimmy Smith, mas jamais obteve o mesmo reconhecimento que o contemporâneo Dexter Gordon. Diga-se, ainda, que o fim da parceria não significou o fim da amizade, tanto é que Edwards compôs “Maggie’s Back In Town”, em homenagem ao trompetista.
McGhee sentia com bastante intensidade a força do racismo na Costa Oeste, sobretudo por ser casado com uma mulher branca, fato que contribuiu decisivamente para aceitar o convite de Norman Granz. Nos anos 50, problemas com drogas praticamente paralisaram a sua carreira e o obrigaram à inatividade forçada, embora tenha feito gravações esporádicas com J. J. Johnson, Pepper Adams, Duke Jordan, Tommy Flanagan, Sahib Shihab, Ron Carter, Percy Heath e Kenny Drew.
Nos anos 60, já recuperado, Maggie, como era conhecido entre os amigos, voltou aos palcos e estúdios com o apetite de um leão. Lançou, em 1960, uma elogiada versão do score da peça “The Connection”, pela Felsted Records, ao lado do pianista Freddie Redd (autor da trilha sonora e que, por motivos contratuais, usou o pseudônimo de I Ching nas gravações), Tina Brooks, Milt Hinton e Ossie Johnson. Gravou regularmente para selos como Argo, Fantasy, Contemporary, Bethlehem e Storyville.
Formou interessantes parcerias com Charlie Rouse e James Moody, tocou com Duke Ellington, Johnny Hodges e Barry Harris e liderou algumas big bands em Nova Iorque, durante os anos 60. Além disso, dedicou-se intensamente ao ensino de música em diversas escolas da cidade. Um dos pontos altos da discografia de McGhee – e de Edwards também – foi o disco que celebrou o retorno da parceria, catorze anos depois de haver sido desfeita.
O álbum se intitula, apropriadamente, “Together Again!!!!” e os quatro pontos de exclamações grafados após o título são plenamente justificados. As gravações transcorreram nos dias 15 e 17 de maio de 1961, nos estúdios da Contemporary em Los Angeles, sob a produção do big boss Lester Koenig. Acompanhando os líderes, os espetaculares Phineas Newborn Jr. ao piano, Ray Brown no baixo e Ed Thigpen, cujo pai havia sido companheiro de McGhee na orquestra de Andy Kirk nos anos 40, na bateria.
A faixa que abre e dá nome ao disco é uma composição de Edwards, escrita especialmente para o reencontro. Trata-se de um blues anabolizado, altamente influenciado pelo hard-bop, com direito a um trabalho soberbo de Brown. O diálogo dos líderes é sempre muito estimulante e os solos de McGhee transitam entre a dolência do blues e a incandescência do bebop.
O standard “You Stepped Out Of A Dream” vem inebriado de odores latinos – cortesia da percussão malemolente de Thigpen. McGhee usa a surdina com muita altivez e imprime ao seu fraseado um pequeno acento oriental, dando um sabor ainda mais exótico a esse cardápio delicioso. Edwards executa alguns dos mais belos e complexos solos do álbum e Brown, como sempre, funciona como uma pista de pouso segura e bem iluminada. Por mais altos que sejam os vôos de seus companheiros, eles sabem que não haverá problemas na aterrissagem.
Pequena gema concebida por Brow, “Up There” é um bebop nervoso, que funciona como o veículo perfeito para as maravilhosas pirotecnias de Edwards. “Perhaps” é uma composição de Charlie Parker não muito conhecida e ganha uma versão à altura da genialidade do seu criador. Além dos fantásticos solos Edwards e McGhee, o destaque fica por conta das improváveis harmonias inventadas por Newborn, que mostra porque merece figurar entre os maiores pianistas de todos os tempos – e um dos poucos dos anos 50 e 60 que não provém diretamente de Bud Powell.
A eterna Misty, de Erroll Garner, recebe tratamento cinco estrelas. Lindíssima versão, desde a fabulosa introdução, a cargo de Edwards, até o derradeiro acorde. Encerrando o set, uma composição do trompetista, o fulgurante bebop “Sandy”. São quase dez minutos de virtuosismo, criatividade e total domínio técnico por parte de todos os integrantes do combo, que têm amplo espaço para exibir as suas habilidades, embora os solos de McGhee, por sua plasticidade, sejam dignos de atenção redobrada por parte do ouvinte. Um disco espetacular, merecedor de quatro estrelas por parte do rigoroso Penguin Guide.
McGhee e Edwards cultivaram a sólida amizade ainda por muitos anos. O primeiro manteve-se em atividade regular até o final dos anos 70, embora tenha lançado poucos álbuns como líder nesse período – seu último álbum foi “Wise In Time”, de 1979, pelo selo Storyville. A década de 80 foi pouco produtiva para o trompetista. Ele morreu no dia 17 de julho de 1987, em Nova Iorque, aos 69 anos.
O segundo atravessou as décadas de 60 a 90 trabalhando como músico de estúdio e lançando seus discos por selos como Pacific, Contemporary, Prestige, Xanadu, Muse e SteepleChase. Tocou com os tenoristas Houston Person e Dick Morrissey, com os pianistas Ronnie Mathews e Richard Wyands e acompanhou o cantor Tom Wayts. Viajou pelo mundo inteiro, fazendo shows em países como Inglaterra, Holanda, Suíça e Alemanha. Em 2000 e 2001 lançou os elogiados “Ladies Man” e “Smooth Sailing”, ambos pelo selo High Note. Faleceu no dia 20 de abril de 2003, às vésperas de completar 79 anos.
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