A ESCADA E A PONTE
Música e outras coisas

A ESCADA E A PONTE



No desabrochar da paixão primeva,

Afogada por prestimosa vaidade,

Ressente-se a mente longínqua

Que sobeja fazendo alarde


Amores ou ressentimentos

Razões de todas as bocas,

Que se buscam nas madrugadas

Que se presenciam, loucas


Desenlace das coisas céleres

Timidez que escamoteia o pranto

Quando a saliva é o combustível

Luzir de tocha sem qualquer encanto


Ao largo a dor atravessa

Contrição de sepultamento

Ecoa o clamor, amiúde

E a terra cobra seu lamento


Repouso, veleidade materna,

Qual visita ao cemitério,

Desdobra-se o espaço purpúreo

Enquanto, ao norte, adormece o saltério


Hábito de terna significância

Magenta é a cor do desejo

Que se perde nas calmarias

Caminho que é quase um lampejo


Substrato de inexistente cinza,

Linguagem de rimas a esmo,

No encalço de mil cadafalsos

Segue o périplo último do enfermo


O sereno a rosnar no tempo

E o orvalho seco à luz da vitrine

Margeiam o átrio solene

Se há culpa, a razão exime


Na opacidade rigorosa do inverno

A aurora breve posterga o ocaso

O tísico oculta as febres

À sombra zelosa do parnaso


Obra de construtor remissivo,

É o corpo a certeza cabal

Sob a luz acanhada e vadia

Enquanto a sombra tosquia o umbral


Os óleos dos corpos em êxtase,

Reproduzem-se impávidos, brutos

Compõem a mácula que cerceia,

Travestem-se em anônimos lutos


E a rubra certeza que inflama

As vestes de se despir

Maneja o cinismo oculto

Transformando em fuga o partir


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Gigi Gryce, cujo nome completo era George General Grice Jr., nasceu em 28 de novembro de 1925, em Pensacola, Flórida, mas foi criado em Hartford, no estado de Connecticut. Na primeira metade dos anos 40, serviu na marinha, em uma base na Carolina do Norte, onde conheceu o trompetista Clark Terry. Embora também tocasse sax tenor, sax barítono, clarineta e flauta, ficou mais conhecido por seu trabalho como saxofonista alto, tendo sido fortemente influenciado por Charlie Parker.


Também era arranjador, compositor (“Minority”, “Yvette”, “Social Call”, “Capri” e “Nica's Tempo” são algumas de seus temas mais conhecidos) e educador musical. Sua formação inclui composição clássica no prestigioso Conservatório de Boston, sob a tutela de Daniel Pinkham e Alan Hovhaness. Alguns anos mais tarde, estudou em Paris com a aclamada regente Nadia Boulanger. Aliás, na seara erudita, Gryce compôs uma sinfonia, dois balés e música de câmara.


No início dos anos 50, elaborou arranjos para Howard McGhee, Thelonious Monk (com quem tocaria no excelente “Monk’s Music”, de 1957), Max Roach, Kenny Dorham, Ray Charles, Curtis Fuller e Stan Getz. Também tocou com Tadd Dameron, Lee Morgan, Lionel Hampton, Duke Jordan, Lou Donaldson, Teddy Charles, Oscar Pettiford, Dizzy Gillespie, Vince Guaraldi, Betty Carter, Randy Weston, Lucky Thompson e Benny Golson, entre outros.


Quando integrava a orquestra de Lionel Hampton, participou das célebres gravações de seu companheiro Clifford Brown para o selo Vogue, em Paris. Em meados dos anos 50, criou o Jazz Lab Quintet, ao lado de Donald Byrd, que lançou alguns poucos, mas relevantes, discos. Outra associação bastante frutífera foi com o trompetista Art Farmer, ao lado de quem gravou alguns ótimos álbuns para a Prestige. Em 1956 criou a Melotone, misto de gravadora e editora musical destinada a administrar a sua produção.


“The Rat Race Blues” é, provavelmente, o álbum mais conhecido de Gryce. Gravado 1960, para a Prestige, aqui encontramos o saxofonista ladeado por excelentes músicos de apoio: Richard Williams (trompete), Richard Wyands (piano), Julian Euell (baixo) e Mickey Roker (bateria). Ponto culminante da esparsa discografia de Gryce como líder, reflete o seu profundo conhecimento acerca da música negra americana, em especial o blues e o spiritual.


Em “Rat Race Blues”, do próprio Gryce, a idéia central é reproduzir a atmosfera caótica das grandes cidades – o piano de Wyands ajuda a executar a empreitada com absoluto sucesso. “Strange Feelin” é um spiritual de estrutura mais convencional, de autoria de Sam Finch, com um excepcional entrosamento entre o sax do líder e o trompete de Williams. Também de de autoria de Gryce, “Boxer’s Blues” é outro grande momento do disco, com sua estrutura harmônica cheia de alternâncias e seu clima pungente.


Duas composições de Norman Mapp – “Blues In Bloom” e “Monday Through Sunday” – encerram o disco em grande estilo, a primeira com uma levada hard bop e a segunda calcada na tradição de New Orleans. Em ambas o trompete de Williams, parceiro de Gryce em outras empreitadas, como em “Sayn’ Something” (gravado alguns meses antes, em março de 1960), merece os maiores encômios. Trata-se de um músico tecnicamente irrepreensível, dono de um fraseado feérico e de concepções harmônicas bastante arrojadas, servindo à perfeição para realizar os intensos e tecnicamente complexos diálogos propostos pelo líder. Um disco que precisa ser conhecido, de um artista cujo talento jamais recebeu o reconhecimento merecido.


No início dos anos 60, o saxofonista converteu-se ao islamismo e adotou o nome de Basheer Qusim. Nessa época, problemas de saúde e também financeiros fizeram com que ele se afastasse da cena jazzística, embora permanecesse ligado à música, ensinando em escolas de Nova Iorque e Long Island. Faleceu em Pensacola, no dia 17 de março de 1983, vitimado por um ataque cardíaco fulminante.


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