Um músico, um instrumento (Solo VIII)
Música e outras coisas

Um músico, um instrumento (Solo VIII)


A exploração solista percussiva de Andrew Cyrille caminha por rumos bem diversos dos tateados por Roger Turner. Cyrille foi um dos primeiros nomes de destaque da bateria free jazzística, ao lado de Milford Graves e do pioneiro Sunny Murray.
Andrew Cyrille (1939, Brooklyn), filho de mãe haitiana, passou pela Juilliard School e chegou a tocar com músicos mais tradicionais, como Coleman Hawkins e Mary Lou Williams, antes de se juntar ao grupo de Cecil Taylor em 1964. Com o pianista, trabalharia por cerca de uma década e ganharia fama como um dos grandes da percussão livre. Na década de 70, Cyrille passou a assumir o papel de líder e gravou, com seu grupo Maono, vigorosos trabalhos como “Celebration” (75) e “Junction” (76), que contaram com a participação do jovem David S. Ware. Esses discos estão, infelizmente, há muito tempo fora de catálogo.


A trajetória do baterista é marcada por encontros com os maiores nomes da free music dos 60s para cá: Jimmy Lyons, David Murray, Oliver Lake, Muhal Richard Abrams, Carla Bley, Marilyn Crispell, Reggie Workman, Butch Morris, William Parker, Dominic Duval, Leroy Jenkins, Peter Brotzmann, Borah Bergman, Sun Ra, Anthony Braxton, Charlie Haden: todos contaram com as baquetas de Cyrille em algum momento. Interessante capítulo vivenciou ao lado de Milford Graves em 69, quando se reuniram para uma apresentação em duo no Brooklin. Passaram a repetir a experiência nos anos seguintes e, para adicionar dinamismo aos concertos, chamaram um terceiro baterista: Rashied Ali. A série de apresentações recebeu o nome de
“Dialogue of the Drums”. Em 74, Cyrille e Graves fizeram uma versão dos encontros para ser lançada em vinil. Nos anos 80s, Cyrille voltou a se reunir a Graves e convocou também Don Moye e o veterano do bebop Kenny Clarke, gerando um incrível quarteto de percussionistas batizado de ‘Pieces of Time’.

A primeira gravação realizada por Cyrille como líder, em 1969, trazia o músico sozinho explorando os limites da bateria. O álbum, What About?, foi gravado em Paris, sendo editado pelo lendário selo BYG. What About? é um registro pioneiro de bateria-solo no campo free/jazzístico. Diferente da sutileza demonstrada por Roger Turner em seu "The Blur Between", Cyrille parte do kit-base da bateria (como pode ser apreciado especialmente nas faixas 1 e 3) para compor What About?, abrindo seu toque a outros elementos percussivos no decorrer do álbum, criando um trabalho robusto e de grande força.

Depois de lançar o disco na coleção Actuel da BYG, Cyrille tentou reeditá-lo sem sucesso nos EUA. Um dos capítulos de sua peregrinação infrutífera pelas gravadoras americanas ocorreu no escritório da Columbia, onde se encontrou com o chefão John Hammond, que se auto-proclamava descobridor de Billie Holiday e Count Basie. Uma vez com Hammond, o percussionista, confiante na relevância de seu projeto, colocou o álbum para rodar no toca-discos. A demonstração não durou dois minutos: o executivo apertou o ‘stop’ e disse: “Não estamos interessados em criatividade percussiva, mas sim em fazer o capital girar”. What About? ficaria fora de catálogo por longo tempo, recebendo uma nova versão, em LP, apenas depois de passadas três décadas desde seu lançamento –curiosamente, pelas mãos de um selo alemão.


A1 What About? (12:58)
A2 From Whence I Came (10:08)
B1 Rhythmical Space (12:22)
B2 Rims and Things (6:50)
B3 Pioneering (4:30)

Recorded August 11, 1969, Studio Saravah, Paris.



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