Michel Pilz (Alemanha, 1945) pertence ao ramo dos músicos discretíssimos, muitas vezes sombreados por seus pares. Chega a ser mais lembrado por sua ligação com Manfred Schoof e Alex Von Schlippenbach que por sua obra em si. Como Pilz não gravou muito como líder –além de parte desse material estar fora de catálogo–, não é comum vermos seus discos circulando nem no mundo virtual. Sua especialidade é o clarinete-baixo, instrumento que costuma ser diretamente associado no free jazz a Eric Dolphy (1928-1964), que desempenhou papel central no estabelecimento do idioma moderno desse sopro. Para o crítico Joachim Berendt, foi por meio de Dolphy que o clarinete-baixo “se tornou definitivamente um instrumento de jazz”. É claro que houve outros músicos antes de Dolphy que testaram, esporadicamente, esse sopro no jazz. Ainda na década de 1920, Omer Simeon (1902-1959) fez isso ao lado de Jelly Roll Morton. O baritonista Harry Carney (1910-1974) fez o mesmo enquanto trabalhava na orquestra de Duke Ellington. Mas Dolphy é o pai do clarone moderno, sem dúvida. Foi ele que abriu um caminho depois muito explorado na Europa, nicho no qual floresceram figuras como Michel Portal, Willem Breuker, Gunter Hampell e John Surman. Contemporaneamente, Hans Koch e Louis Sclavis estão entre os que têm colaborado para a expansão do idioma do clarinete-baixo. E Pilz deveria ser reverenciado como pólo central nessa seara.
Michel Pilz cresceu em Luxemburgo, onde foi para conservatório estudar música clássica, dedicando-se ao clarinete. Adentrou a seara jazzística nos anos 1960, tendo se aliado em 68 ao quinteto de Manfred Schoof (vídeo abaixo), com quem tocaria nas décadas seguintes. Logo se juntaria também à Globe Unity Orchestra, aparecendo nos álbuns “Live in Wuppertal” (73), “Pearls” (77) e “Compositions” (80). Pilz chegou a gravar com o cultuado grupo krautrock “Guru Guru”, participando de “Globetrotter” (77). Paralelamente, montou seus trios/quartetos e começou a arquitetar sua obra, relativamente discreta. Carpathes (75), ao lado de Peter Kowald e Paul Lovens, é um precioso registro desse momento. Na sequência viria “One Year” (78), com a participação do trompetista japonês Itaru Oki, que retornaria em “Jamabiko” (83), álbum que trazia nas baquetas Mohammad Ali. Nos anos 2000, o instrumentista focou seus esforços em um trio regular (Christian Ramond, baixo; Klaus Kugel, bateria). Com eles, lançou em 2003 “Arbor”.
Pilz mereceria ter um destaque maior na cena –e não me refiro apenas dentre os que exploraram o mesmo instrumento que ele. Sendo um dos raros nomes totalmente focado no clarinete-baixo, o músico deixou registros de grande expressividade e força, infelizmente muitos deles esquecidos. Um de seus melhores trabalhos é Celeste, editado em 1978. Acompanhado do baterista Uwe Schimitt e de seu costumeiro parceiro Buschi Niebergall no baixo, Pilz exibe pontos amplos de sua música, oscilando beleza contemplativa com dinâmica e agilidade. Da esfera sombria de sua música, emergem as faixas “Celeste” e “Linde”; caso distinto é “Telep”, que mostra a força e a pegada mais arisca de sua improvisação. Dono de colorido que varia entre o robusto e o lírico, Pilz faz deste Celeste um disco realmente revelador e central em sua obra, injustamente pouco incensada.
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