Quando Mr. Dorgon se encontrou com Mr. Parker
Música e outras coisas

Quando Mr. Dorgon se encontrou com Mr. Parker


Gordon Knauer (1967, USA) é cria da downtown scene de NY. Saxofonista que também se aventura por clarinete e, cada vez mais, a pesquisas eletrônicas, assina como Mr. Dorgon (às vezes, apenas Dorgon). Artista curioso que parece não levar nada muito a sério, faz seus próprios discos e prefere se manter à margem na cena. Praticamente toda sua produção se reúne no selo que criou, o ‘Jumbo’. Seus discos ficaram conhecidos por serem feitos de forma bastante artesanal, com capas de sobras de papelão e caixas vazias, pintados à mão ou com adesivos colados, embalados em saquinho ou mesmo caixinha de CD usada. A escassa biografia do músico não permite acompanhar bem sua trajetória; pouco se sabe além de seus registros sonoros. E isso é o que ele deseja: tanto que mesmo nos textos encontrados em seus álbuns a opção pela brincadeira supera a necessidade da informação. O disco '9', por exemplo: a contracapa 'informa' que foi gravado em 15 de fevereiro de 1936, em uma pausa durante uma turnê com Sidney Bechet... Em seu myspace, ele se define simplesmente assim: “Mr. Dorgon is a composer of intuitive + counter-intuitive musics & makes visual art”. Se é que podemos confiar em suas palavras, o músico aponta dentre suas preferências nomes distintos como John Lee Hooker, Ornette Coleman, Sun Ra, Motorhead, Borbetomagus e Brian Eno.

De concreto sabe-se que o músico começou a fazer seus registros em meados da década de 1990. E esse início foi em alto estilo: em 98, assinaria pelo Jumbo dois álbuns (‘9’ e ‘Broken/Circle’) em duo com o baixista William Parker, já consagrado à época como membro do lendário David S. Ware Quartet. Na sequência, viriam outros duetos, dessa vez com a baterista Laura Cromwell. Outro importante testemunho da virada dos 90/00 é o quinteto ‘Gordon y Su Grupo’, que ainda contava com Laura nas baquetas. Esses trabalhos mostram Mr. Dorgon concentrado nos saxes, antes de mergulhar em investigações eletrônicas, que têm dado a tônica de sua produção nos últimos tempos. Fora de seu selo, o instrumentista quase não gravou. Uma das exceções é “God is Greatest”, editado pelo Tzadik de John Zorn em 2005.

Uma das vivas gravações de Mr. Dorgon é '9', realizada ao lado do gênio William Parker. Se não chega a ser um trabalho impressionante, '9' consegue prender o ouvinte com suas quatro arrastadas peças. Não apenas por ser a cara famosa da dupla, Parker é imprescindível para o sucesso da empreitada. É que fica claro que o sopro de Dorgon carece de inventividade improvisativa e/ou melódica –e isso é ainda mais evidente dado o porte das intervenções de Parker, que se divide entre arco e pizicato. O C-Melody saxofone conduzido pelo instrumentista ecoa certo lirismo primitivo, sem muita variação de intensidade, colorido ou forma, o que se explicita logo na primeira faixa, "POG". Já a riqueza da técnica de arco de Parker estabelece picos arrepiantes, exalando tensões climáticas e momentos brilhantes. O triunfo do arco marca "Hardcore (Brooklyn)", com o baixista criando uma malha de intensos graves contrastantes com a letargia do sopro espaçado, que não hesita em sair de cena algumas vezes, esquentando asperamente somente no final da peça.


1. POG
2. BTBB
3. Hardcore (Brooklyn)
4. In Bloom
nn

*Mr. Dorgon: C-Melody saxophone
*William Parker: bass

Release date: 1998.



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