O ÚLTIMO BONDE
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O ÚLTIMO BONDE


Bonde da Tramways - foto de Allan Morrinson



Em 1956, ainda com 10 anos de idade, entrei num impasse.
Tinha terminado o curso primário na Escola Padre Donino, com as professoras Ceminha e Dalu e estava pronto para enfrentar o ginasial.
Mas, havia uma idade mínima para iniciá-lo: 11 anos.
Ocorre que eu só completaria 11 anos no final do ano, em 20 de dezembro... o que fazer, então ?
Tinha muita gente nessa situação e a solução era "encher lingüiça" durante um ano letivo inteiro com uma revisão geral de matérias do curso primário chamada "curso de admissão ao ginásio".
Fui matriculado no então Ginásio, hoje Colégio São Luiz, dos Maristas, na Avenida Rui Barbosa, Graças.
Quando não ia com Paizinho, no “jeep”, pegava o bonde de Apipucos/Dois Irmãos e rumava para o São Luiz.
Como todo garoto metido a gente, gostava mesmo era de ir em pé, no estribo, que vinha a ser -pra quem nunca andou de bonde- uma grande tábua de madeira bem grossa e forte, presa no suporte lateral da carroceria de aço.
Era uma viagem muito divertida, pois os muitos meninos que tomavam esse bonde gostavam de brincar de "gato e rato" com o trocador (o bilheteiro) e toda vez que ele se aproximava para cobrar a passagem, o bilhete, a gente se afastava, ora aproveitando uma parada, ora mudando de lugar, andando mesmo, equilibrado no estribo e segurando na balaustrada do veículo.
Não era tão perigoso quanto pode parecer, porque o bonde se deslocava muito lentamente.
O motorneiro, soprava um apito de metal, feito esses de guarda de trânsito, nos pontos de parada, para avisar que terminara a pausa de espera pelos passageiros retardatários e um novo trecho se iniciava.
Tenho pra mim que, na linha de Casa Forte, a roda que o motorneiro girava para aumentar a velocidade do veículo, nunca chegou aos 9 pontos, marca máxima de velocidade daqueles trenzinhos urbanos tão simpáticos e que deixaram tanta saudade.
Esses famosos “9 pontos”, creio eu, equivaleriam, hoje, a uns 20 ou 25 km por hora, média aliás, superior à de um automóvel super-moderno, mas também super-parado, nesses enormes engarrafamentos que atravancam uma cidade inteira.
A gente fazia isso por farra mesmo, porque todo mundo da turma andava com um bloquinho de bilhetes no bolso (custava Cr$ 0,50 -cinqüenta centavos de cruzeiro cada) que nosso pai comprava por antecipação na Pernambuco Tramways & Power Co., a companhia inglesa que vinha desde o início do século XX explorando esse serviço.
Não tenho bem certeza se em 1955 a Tramways já havia sido vendida a algum grupo nacional, mas o nome da empresa pintado nos bondes amarelos com faixas marrons era ainda esse.
Penso que o bonde de Apipucos/Dois Irmãos foi o último a rodar no Recife e eu ainda fui testemunha/usuário da transição entre esse veículo elétrico, ecológico, confortável, ventilado e seguro e os fumacentos ônibus da Autoviária e da São Jerônimo, cuja estrela era o famoso "papa-fila".



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