O clarinete solitário de John Carter
Música e outras coisas

O clarinete solitário de John Carter


O clarinete está longe de figurar entre os protagonistas da free music. Temos, sim, grandes figuras de ontem (Jimmy Giuffre, Perry Robinson) e de hoje (Alex Ward) que se dedica(ra)m centradamente ao instrumento, mas o que muito acabamos presenciando, na realidade, são saxofonistas que também exploram o clarinete, como Ken Vandermark, Peter Brotzmann e mesmo Ab Baars.
Quando se fala em clarinete no free jazz difícil não destacar John Carter (1929-1991). Contemporâneo e conterrâneo de Ornette Coleman, Carter também começou no sax alto em sua cidade natal, Fort Worth, no Texas. Quando jovens, nos 40/50, Carter e Ornette dividiram ideias e gigs – mas não voltariam a ser parceiros diretos no futuro, quando já músicos profissionais. Carter dedicou boa parte de sua vida ao meio acadêmico, tendo estudado música na Lincoln University (graduação) e na University of Colorado (mestrado). Entre 49 e 61, viveu principalmente como professor em sua Fort Worth natal. Foi quando decidiu partir para Los Angeles para dar chances de espandir sua carreira como músico. Naquele 1961, Ornette já se tornara conhecido no mundo do jazz e gravado seu clássico “Free Jazz”. Carter ainda era apenas um saxofonista e clarinetista tentando arrumar um espaço seu. E se não conseguiu historicamente tanto quanto Coleman, ao menos deixou sua música viva para a posteridade.

 

Em 64, Carter já havia conhecido seu principal parceiro, o trompetista Bobby Bradford, com quem fundaria o “New Art Jazz Ensemble” e editaria seus primeiros álbuns, Seeking e Flight for Four, no ano de 1969. Após a estreia tardia (Carter já contava com 40 anos de idade), o clarinetista se aproximou de outras figuras do free jazz, tocando parcerias com Horace Tapscott, Arthur Blyte e David Murray. Foi então que, em 1974, decidiu deixar outras palhetas de lado (gostava de tocar os saxes alto e soprano) e se dedicar plenamente ao clarinete, o que fez até sua morte em 1991. Nos anos 80s, participou do conhecido projeto “Clarinet Summit”, um quarteto (sexteto, por vezes) de clarinetistas que contou em suas alternadas fileiras com gente como David Murray, Perry Robinson e Gianluigi Trovesi.
Seu último grande projeto foi “Roots and Folklore: Episodes in the Development of American Folk Music”, uma serie de cinco gravações, realizadas entre 82 e 89 (dentre essas, Castles of Ghana e Dauwhe), com as quais buscou investigar as sonoridades afro-americanas, mostrando mais abertamente sua faceta de compositor e tendo contado com a colaboração de pesos pesados do free como Andrew Cyrille, Baikida Carroll e Fred Hopkins...

Carter não deixou uma discografia ampla, nem como líder nem de colaborações. Mas seu legado (parte ainda inédito em CD) tem força e relevância indiscutível. Alguns registros de Carter em apresentação solística mostram bem sua inventividade improvisativa lírica e ácida. Oficialmente, lançou um disco no formato solo pelo Moers Music, em 1979.
De novembro do mesmo 79, há uma gravação solística em Tubingen (Alemanha), que se mostra como uma bela introdução à sua arte. Entre temas mais inflamados (“Fast Fannies Cakewalk”) e outros contemplativos (“Johnettas Night Song”), Carter oferece um rico aperitivo de seu clarinete, em pouco mais de 40 minutos de sua inconfundível sonoridade, que mostram o quanto sua música merece e deve ser redescoberta.
   

" JOHN CARTER " (solo clarinet)

Live at Universitat Mensa, Tubingen (Germany). 1979, November 24.



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