CARNAVAL VEM AÍ..
Música e outras coisas

CARNAVAL VEM AÍ..


RÓI-RÓIS & CASTANHOLAS
(crônica publicada no livro "Imperador, Imperatriz"), Recife, 2002, ed. do Autor)

Mais um Carnaval se foi, deixando no ar uma tristeza de pierrô traído, uma saudade das loucuras, uma ressaca dos excessos, um vazio dos desejos insatisfeitos, uma ânsia de esperar, de sempre esperar, pelo próximo Carnaval, pela próxima ilusão, enfim...

E chegou mais um Carnaval, alegre como todos sempre chegaram, na minha vidinha de menino do Recife.  Não trazia nada de especial, feito aquelas noites de Natal, cheias de brinquedos, surpresas e esperanças.  Mas trazia uma alegria diferente, plena de cores, cheiros e encantos. 
E vinha lento, dengoso,  preguiçoso, esparramando-se pelos bairros por uma ou duas semanas, até reinar absoluto nos seus três dias de glórias e exaurir-se bêbado e esgotado na quarta-feira de Cinzas, ingrata, chuvosa e chata.
Lembro-me dos preparativos para a semana do Corso: íamos, irmãos e irmãs, agarrados pelas mãos, tal qual uma cordinha de caranguejos, procurar os artigos da época, no bairro de São José.  Eram óculos de plástico colorido e transparente, amarrados por um elástico fininho, a melhor proteção contra os esguichos de lança-perfume, que também comprávamos...Rodouro e Colombina: a primeira em embalagem metálica pintada de dourado, a outra de vidro, com um rótulo bem colorido.  Ambas deixavam no ar um perfume inconfundível e na pele um friozinho inesquecível.  Nos olhos, quando neles batiam, um ardor dos infernos. Daí, os óculos.
E..que mais? Ah, sim! Havia os acessórios indispensáveis para as mais diversas idades.  Saquinhos de filó colorido, para os confetes; pacotes de rolos de serpentina de todas as cores; rói-róis..  Quem mais se lembra dos rói-róis?  Um brinquedinho bobo, mas barulhento e divertido, que consistia em um pequeno cilindro de papelão revestido com papel de seda colorido e franjado, amarrado num cordão, que se enlaçava a um pedaço de madeira untado de breu, na sua ponta.  O contato do cordão com o breu, ao se girar o rói-rói, produzia um som roufenho, amplificado pelo cilindro: daí seu nome.  Esse brinquedo é conhecido no sertão como "berra-boi".  Quem não "rodou" um bom rói-rói na infância, não pode se dizer um folião de verdade.
Apareceram, depois, uns reco-recos industrializados.  Os que conheci, na infância, ainda eram de madeira pintada.  Os de plástico tinham uma catraca e uma lingueta presa a uma haste.  Não tinham muita graça, não.. Creio que sumiram, esquecidos pelos carnavais afora.
Por falar em rói-róis, para onde foram os mascarados e suas inseparáveis castanholas?  Os poucos que hoje vemos, em Olinda, são uma raça em extinção.  Resistem como aratús nos mangues, numa franciscana pobreza.  Máscaras velhas, com a pintura descascada, roupas desbotadas, falta-lhes alegria e entusiasmo.  Rareiam...
Antigamente, andavam aos bandos, às dezenas, verdadeiros blocos multicoloridos, com grandes corações vermelhos, de cetim brilhante, costurados nos fundos dos macacões folgados.  Brincavam, pulavam e estalavam suas castanholas sem parar.  Quando, raramente, falavam com alguém, faziam voz de falsete, para não serem reconhecidos por ninguém da sua rua, do seu bairro.
Acusem-me, como já acusei a tantos, na minha juventude, de querer viver de recordações!  Acusem-me, repito...eu bem mereço.   É essa, a roda da vida, girando e nos apanhando a cada giro, no enlevo do relembrar, no destino inexorável de procurar alegrias no passado tentando, ao menos tentando, reter um pouco dos momentos felizes que vivemos.

Recife, fevereiro de 1999.



loading...

- MÚsicas Para VitÓria-rÉgia (3) Samuel Valente
Na Praça de Casa Forte, o Bloco Flor da Vitória-Regia prepara-se para desfilarNo Festival de Frevo da Prefeitura do Recife, ano de 2006, o compositor e amigo Samuel Valente, grande pesquisador da música brasileira e do frevo em especial, escreveu para...

- O Corso E O LanÇa-perfume
Os trilhos do bonde ainda corriam pelo centro da rua de paralelepípedos. Havia um certo charme europeu nas lojas de tecidos e confeitarias das ruas Nova e Imperatriz. No carnaval era ali o foco do "corso", das brincadeiras, do desfile dos blocos, clubes...

- Um Alagoano Em Olinda
O carnaval sempre me fascinou. Aquela alegria incontida, aquele colorido que toma conta de tudo, música, barulho, movimento, em Olinda tudo isso se multiplica. Olinda é a síntese do carnaval. Não é à toa que -ainda hoje- se pensa assim. A cidade...

- E Por Falar Em Cinzas
ETERNO CARNAVAL Este é o título de um poema, que musiquei como frevo-de-bloco e que foi classificado nas eliminatórias do Festival do VII Recifrevo, juntamente com outra música minha "Sol na Moleira", em 1995.  Infelizmente só uma delas fez...

- Carnaval De Pernambuco É Assim
Carnaval, carnaval..de tantas lembranças, de tanta alegria que mal cabe numa vida só.Desde criança vejo no carnaval a forma mais pura de manifestação desse estado de alegria que deveria permear a vida de todos.  Essa maneira quase infantil...



Música e outras coisas








.