Ouvir Marilyn Crispell
Música e outras coisas

Ouvir Marilyn Crispell




Marilyn Crispell é uma das mais refinadas pianistas do jazz atual. Somente quando já rondava os 30 anos surgiu para o mundo jazz, quando se associou, em 78, à Creative Music Orchestra, de Anthony Braxton. E foi com Braxton que ela viveu um dos elevados momentos de sua carreira, ao participar de seu notável quarteto (que ainda contava com Mark Dresser (baixo) e Gerry Hemingway (bateria)) durante cerca de uma década, entre os 80/90.

Nascida em 1947, na Filadélfia, estudou piano e composição no New England Conservatory de Boston. Dona de sons livres, rotulados às vezes de cerebrais, marcados por toques percussivos, Marilyn Crispell é hoje uma das mais apreciadas instrumentistas da cena free. Seu dedilhado carrega ecos da dura música erudita contemporânea _definitivamente, não é uma pianista ‘swingante’: mas quem se importa? Muitas vezes, dá para sentir em seu toque a herança de Cecil Taylor. Todavia, sua obra tem sabor próprio: Crispell soa, acima de tudo, como Crispell.
Presente nos principais festivais de jazz e avant-garde das últimas três décadas, a pianista estreou em disco, como líder, em 82, com ‘Live in Berlin’. Desde então, assinou mais de 40 álbuns, com muito material ao vivo, solos e trios. Como parceira e ‘sideman’, trabalhou com Andrew Cyrille, Anthony Davis, Tim Berne, Eddie Prevost, Paul Motian, Irene Schweizer, Gary Peacock, Fred Anderson, Reggie Workman, além dos brasileiros Marcio Mattos e Ivo Perelman.

No período em que participava do Anthony Braxton Quartet, também excursionou e gravou em formato trio com Dresser e Hemingway. O The Kitchen Concert data dessa época.



Captado em fevereiro de 89, em Nova York, o álbum mostra o trio em sintonia elevada, privilegiando uma sonoridade abstrata, de melodias recortadas e de difícil reprodução. Sempre amparados em composições de Marilyn Crispell, o trio soa bastante distinto do que costumava apresentar ao lado de Braxton: ou seja, não são apenas uma reprodução do fenomenal quarteto apenas sem o ‘reedman’.
A primeira faixa, Solstice, é uma rica introdução ao dedilhado de Crispell. Pode-se apreciar a pianista desenvolvendo sua quebrada e intensa, agressiva até, sonoridade, enquanto Hemingway sutilmente trabalha a percussão. Aqui, fica mais evidente a influência de Cecil Taylor, que será abrandada logo no segundo tema, o mais lírico do concerto.
Crispell é pianista genial, inventiva e fundamental para a música de hoje. Pena que certos ouvidos não consigam ir além das Dianas Kralls da vida...

*Marilyn Crispell (piano, compositions)
*Mark Dresser (bass)
*Gerry Hemingway (drums)

1. Solstice [4:44]
2. What of it I Refuse to Awakes the Wide-Eyed Stone [7:42]
3. Alchemy [7:59]
4. Ahmadu / Sierra Leone [8:23]
5. Night Light Beach 1 [5:06]
6. For L.T. [15:58]


February, 2, 3 & 4, 1989 / The Kitchen, New York City.



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